quarta-feira, 19 de outubro de 2011

FILME MANN, Michael O ÚLTIMO DOS MOICANOS

- O povo do meu pai diz que quando nasceu o sol e sua irmã lua, a mãe deles morreu. O sol deu à Terra sua forma, que foi o início de toda a vida. E ele retirou do seu peito as estrelas, e as estrelas iluminam a noite para lembrá-lo da alma dela.

O diretor Michael Mann é ligado em detalhes. Roupas, armas e objetos de cenário foram construídos como se fazia na época em que o filme se passa. Não satisfeito, todo o elenco teve que passar por todo um curso de sobrevivência na selva, para dar mais autenticidade aos seus papéis.
Somado a isso, Daniel Day-Lewis é um ator conhecido pela imersão que faz para poder viver seus personagens. Segundo muitos dizem, ele vive aquele personagem. Acredito que muito do personagem de Robert Downey Jr. em Trovão tropical tenha sido inspirado nele. Inclusive quando ele diz: "só saio do personagem depois de gravar os comentários em DVD". Para este filme, parece que Day-Lewis viveu alguns meses na selva vivendo da caça e tudo, para poder dar vida à Hawkeye, um inglês adotado pelo último representante da tribo que dá nome ao filme.
Essa riqueza de detalhes dá uma autenticidade interessante ao filme e o torna muito interessante. Mas O último dos moicanos está longe de ser uma obra perfeita. O que dá uma impressão de muito esforço para pouco resultado.
Dois moicanos legítimos andam com Hawkeye, seu pai e irmão adotivos. Os últimos descendentes da tribo. Não saberia dizer se o resto da tribo eram fracos e eles sobreviveram porque eram os mais habilidosos ou se todos eram habilidosos. Acredito que a primeira opção se aproxime mais do real, porque se a tribo toda fosse tão boa quanto esses três, não estaria ameaçada de extinção.
De qualquer forma eles rastreiam uma outra tribo que ataca uma tropa inglesa. O ataque é um massacre, e eles apenas conseguem salvar duas mulheres, filhas de um general, e um oficial. Então resolvem escoltar os três até o forte onde o general está sitiado debaixo de um ataque.
O dilema de Hawkeye é se ele deve ajudar os ingleses na guerra contra a França, ajudar seus amigos que já estão lutando no forte a fugirem de lá para ajudarem nas suas casas que estão sob ataque e se foge dali ou fica perto da mulher por quem se apaixonou, Cora (Madeleine Stowe). O resto é previsível.
Previsível porque o filme toma um ritmo de matinê, filme de Sessão da Tarde, com repetidas cenas de batalhas (incluindo um Hawkeye executando um mesmo golpe pelo menos três vezes no filme). Além da paixão entre ele e Cora, os irmãos dos dois também se apaixonam. Como isso acontece não sei dizer, já que ele deve ter apenas umas três falas no filme e ela apenas fica se lamuriando. Nem sequer conversam em algum momento. Simplesmente há uma troca de olhares em uma cachoeira e pronto, Love is in the air.
Isso é apenas uma das coisas que fico sem entender no filme. Por que três homens, os últimos representantes de uma tribo, rastreiam para matar dezenas, se não uma centena, de homens de uma outra tribo? Por que arriscar escoltar esses ingleses sem a menor ligação com eles?
São questões que me fizeram perder o interesse pelo filme em determinado momento. A situação não piora por conta do elenco. Stowe está bem como poucas vezes esteve. E Day-Lewis, o mais improvável ator para fazer um filme de ação, está impecável.
Na época do seu lançamento, o diretor Michael Mann disse o quanto ficou insatisfeito com o lançamento. Seu corte tinha quase três horas de duração. Os produtores deixaram a versão de cinema com menos de duas horas. Infelizmente, os efeitos dos cortes são sentidos. A única coisa estranha, é que muitos anos depois ele teve a chance de lançar sua versão integral nos famosos Director's Cut de DVD, e sua versão é apenas alguns minutos mais longo do lançado no cinema. O resultado é ainda uma obra incompleta.

domingo, 16 de outubro de 2011

LIVRO OSPINA, Hernando Calvo. O terrorismo de Estado na Colômbia. Florianópolis: Insular, 2010.

Lançado no Brasil após longas polêmicas, por ter seu lançamento vetado na Editora da UFSC e sendo lançado pela Editora Insular meses depois, o livro O Terrorismo de Estado na Colômbia é uma obra de vital importância para se entender a conjuntura política deste país, e abre os olhos para entender diversas outras questões contemporâneas, como por exemplo, suas relações conturbadas com a vizinha Venezuela.
Hernando Calvo Ospina é um jornalista colombiano, refugiado político na França. Atualmente trabalha no jornal Le Monde Diplomatique, e não pode voltar a seu país, por conta das ameaças de morte que recebeu.
O livro trata dos primórdios da criação do estado colombiano, desde a luta de Símon Bolívar pela criação da “Gran Colômbia”, um estado que abarcaria várias das atuais nações da atual América Latina. E mostra que Bolívar estava certo quando, em 1828, afirmou que os Estados Unidos estavam fadados a trazer a miséria à America Latina. Foi de grande interesse das oligarquias colombianas, durante muito tempo, a interferência estadunidense no país, pois esta se mostrava vantajosa aos seus negócios.
O estado colombiano, segundo Ospina, possui uma espécie de “ditadura perfeita”, onde o terrorismo de estado atua. Nele, a democracia se mostra apenas teórica, pois movimentos sociais, sindicais e estudantis são reprimidos violentamente, geralmente com a eliminação de seus líderes. Diz-se, na Colômbia, que é mais fácil montar uma guerrilha do que um sindicato, pois os líderes dos movimentos costumam ser assassinados no dia seguinte. Toda a violência, diga-se de passagem, é apoiada pela Igreja Católica. Em relação a isso, o livro é bastante didático quanto ao surgimento das guerrilhas, pontuadas como necessárias para a sobrevivência daqueles que ousam resistir ao violento estado colombiano e suas imposições. Entre 1946 e 1958, estima-se que mais de trezentos mil liberais gaitanistas teriam sido assassinados. Inspirados em Jorge Eliécer Gaitán, um político anti-imperialista e populista que fora assassinado antes que pudesse se eleger, causando a ira de milhares, senão milhões de colombianos. Entre estes grupos guerrilheiros, nascia posteriormente, na década de 1960, as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, mais conhecidas como FARC.
Podemos dizer que uma das principais contribuições do livro está nas diversas demonstrações da interferência estadunidense na América Latina desde o século XIX. A Agência Central de Inteligência (CIA), como já comprovado por documentos e relatos no decorrer dos anos, foi responsável pela inserção da Ideologia de Segurança Nacional na América Latina, resultando nas ditaduras que oprimiram suas nações. No entanto, a Colômbia mostrou-se um caso diferenciado; tamanha era a repressão estatal e o controle dos militares sob o povo que, mesmo a doutrina da Segurança Nacional fazendo parte da realidade colombiana, não houve a necessidade de um golpe militar, haja vista que os militares já possuíam enorme poder.
O governo, impossibilitado de agir a bel-prazer por conta de pressão internacional, viu como alternativa para seus problemas a criação de grupos paramilitares. O livro é enfático quanto ao apoio estatal aos grupos – embora o Estado convenientemente negue qualquer filiação a esses grupos e se diga perseguidor dos mesmos – e sobre o apoio que os paramilitares recebem de latifundiários, narcotraficantes, etc. Explicita também que o governo possui relações íntimas com os traficantes de cocaína no país; não é a toa que o agora ex-presidente colombiano, Álvaro Uribe, possuía relações com Pablo Escobar, narcotraficante conhecido mundialmente. Os exemplos dessa relação são diversos.
Ospina mostra um Estado que oprime o povo, limita sua liberdade, é subserviente à influência estadunidense, aplica a ideologia de Segurança Nacional, buscando inimigos internos, geralmente inexistentes, manipula eleições para beneficiar os liberais e conservadores (nomenclaturas diferentes que não mudavam o fato de ambas agirem da mesma forma), tortura dissidentes, mata povoados inteiros por questões de interesse político e econômico, elimina políticos populistas e anti-imperialistas que eventualmente tenham apoio da população ou tentem reformas; tudo com a ajuda dos Estados Unidos da América, que desde muito tempo tenta impor sua vontade aos países que julga inferiores como a soberana.
O livro possui uma linguagem fácil, mas a quantidade de informações dadas, a repetição de algumas questões, a pouca problematização – levamos em conta que o livro foi escrito por um jornalista, que possui uma metodologia diferente dos historiadores – e a eventualidade de uma não-familiaridade com a história da Colômbia por parte do leitor pode tornar a leitura do livro maçante, caso o mesmo não possua grande interesse no assunto. Altamente recomendado para quem se interessa pela história da América Latina e por aqueles que se interessam em estudar os impactos do imperialismo estadunidense no mundo, já que estuda uma caso bem específico. Entretanto, possivelmente não agradaria a leitores casuais.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

LIVRO HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil

HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil; organização de Ricardo Benzaquem de Araújo; Lilia Moritz Schwarcz. Edição revisada. São Paulo: Companhia das Letras. 2006. Capa dura.

Lançada em comemoração aos 70 anos da primeira edição de Raízes do Brasil, está obra é dividida em duas partes, a primeira com o texto de Raízes do Brasil, próximo ao meio um acervo de fotos de Sérgio Buarque de Holanda e na segunda metade artigos de estudiosos no autor e sua obra.
Nos dois prefácios iniciais do livro, Holanda fala das mudanças que ele introduz na segunda edição (como a mudança do título Semeador e Ladrilhador) e no segundo prefácio as mudanças como o índice onomástico e o debate com Cassiano Ricardo. No primeiro capítulo do livro (Fronteiras da Europa) inicia-se com um estudo profundo do reino português e suas peculiares características, como um “território-ponte” descarregado do europeísmo de outras nações. Algumas características particulares são destacadas como próprias dos dois reinos ibéricos. Conceitos como a Cultura da Personalidade, as divisões entre as classes sociais menos rígidas como em outras partes, o conceito ócio/negócio, as precárias idéias de solidariedade e do conceito de cultura, que segundo Holanda só absorve outras que lhe convém, são apresentadas como algumas das várias características dos povos espanhóis e portugueses.
No capitulo 2 (Trabalho e Cultura) são discutidos dois aspectos do Brasil colonial; a valorização da figura do aventureiro (vinculada a idéia do português colonizador) e o oposto a figura do trabalhador. A partir do imaginário existente em Portugal, onde o trabalho não era bem visto na sociedade, como o próprio trabalho agrícola pouco valorizado na terra de El-rei pelas poucas almas lá presentes, ao contrário do Brasil, onde a maioria se constituía de negros e escravos. O capítulo finaliza com a influência holandesa no Recife (batizada de Nova Holanda) e a dificuldade dos Batavos de se adaptarem ao novo clima e habitantes.
Idéia próxima do capítulo anterior, neste (Herança Cultural) Holanda centraliza acerca das heranças adquiridas do Brasil por Portugal. Destarte, o destaque é a dicotomia cidade/campo, com a cidade (pobre) sendo apenas um anexo das atividades do campo (rico), destacando assim o poder do senhor rural. A escravidão no Império tinha um importante papel como fonte econômica do império. O fim do tráfico negreiro em 1850 obriga a mudança na economia brasileira por vias do capitalismo em sua modernização, como na construção da primeira estrada de ferro no Brasil (Mauá-Fragoso).
A separação entre Portugueses e Espanhóis é o tema central do quarto capítulo (O Semeador e o Ladrilhador). Aos Espanhóis (ladrilhadores) sobre as ordens do exclusivismo castelhano existia a ideia de uma linha reta (que ordenaria o mundo conquistado) e mais rígida que seus vizinhos da península. Em Portugal desde sua chegada a América, aproveitando-se da população indígena existente no litoral fazia pouco tempo e de baixa variação lingüística, os lusos em geral apenas partiam de um centro para construírem suas casas conforme o capricho dos moradores, assim como as mudanças costumeiras no reino Português. As bandeiras, a partir dos conceitos anteriores forneceram a silhueta posterior do Brasil.
A cordialidade dos Brasileiros é à base do capítulo 5 (Homem Cordial), nele Holanda discorre acerca das características dos Brasileiros, como a inhaeza no trato, hospitalidade, generosidade, apego aos diminutivos etc. Nos relatos posteriores do capítulo, como do estrangeiro da Filadélfia, em que os Brasileiros têm que serem amigos para negociar ou o interesse maior nos festejos que mesmo nos cultos reforçam a ideia do homem cordial.
O capítulo seguinte (Novos Tempos) alude sobre os rumos do Brasil naquela época. O título de doutor trazia “imunidade” e poder ao seu proprietário. Os positivistas considerados por Holanda “como uma raça que deu certo no Brasil” e a mudança da Monarquia para a República vinda de cima e na famosa descrição de Aristides Lobo enfatizam a ideia.
Um paralelo de idéias com o capítulo anterior é o tema do último capítulo de Raízes do Brasil (Nossa Revolução) com destaque ao Império Brasileiro. Com o fim da escravidão no Brasil acarretam-se outras mudanças, como a troca do engenho pela usina e uma maior democracia a partir do café, centros urbanos desestabilizando o arcaico sistema ultramarino e nossa curiosa participação na Guerra do Paraguai, mas por força que motivação dos participantes.
Na segunda parte do livro iniciam-se as homenagens acerca dos 70 anos de Raízes do Brasil, começando por fotos da vida de Holanda desde sua infância até próximo ao seu falecimento.
Antonio Candido (O Significado de Raízes do Brasil, 1967) compara a obra Raízes do Brasil com dois outros clássicos; Casa Grande & Senzala (Gilberto Freyre) e Formação do Brasil Contemporâneo (Caio Prado Jr.), atribuindo um caráter de maior importância ao escravo na primeira obra e marxista na segunda, disserta também como a direita Brasileira rejeita as obras nos primeiros momentos e finaliza com a ideia do contraste de impedir o dogmatismo, algo típico de Raízes do Brasil. Em 1986, Candido reescreve após Raízes de o Brasil completar 50 anos e enfatiza seu caráter popular. Alexandre Eulálio (Antes de tudo um escritor, 1986) faz uma leitura bibliográfica de Holanda, e destaca sua estadia na Alemanha, a faculdade Direito que Holanda cursou no Rio de Janeiro e a produção do texto Corpo e Alma do Brasil, que originou Raízes do Brasil. Evaldo Cabral de Mello traz importantes considerações como a influência da teoria da América, Weber, a sociologia alemã expressas em Raízes do Brasil e a obra Visão do Paraíso ser a pioneira da história das mentalidades no Brasil. Boliar Lamounier (Sérgio Buarque de Holanda e os grilhões do passado, 2006) enfoca a teoria culturalista de Raízes do Brasil, a clareza dos diagnósticos e entre outros, a flexibilidade do Portugal medieval, origem possível de um Brasil flexível. Antonio Arnoni Prado (No roteiro de Raízes, 2006) elucida a critica do Holanda aos modernistas e a visão do novo que Raízes do Brasil proporcionam ao leitor. Pedro Meira Monteiro (Buscando a América, 2006) centraliza-se na temporada alemã de Holanda. Robert Wegner (Um ensaio entre o passado e o futuro, 2006) disserta sobre a relação de Holanda e Gilberto Freyre, as aulas de Friedrich Meineche que Holanda assistiu e seu curso de Direito após a publicação de Raízes do Brasil. Uma das partes mais polêmicas do livro está na carta de Cassiano Ricardo (Variações do Homem Cordial, 1948), nela Ricardo disserta o conceito de Homem Cordial de Holanda profundamente, como a própria critica a este conceito e as mudanças feitas pelo próprio Holanda em Raízes do Brasil original, a ideia do Brasileiro conciliador e a inexistência do racismo no Brasil. Holanda no mesmo ano produz uma resposta (Carta a Cassiano Ricardo, 1948) em que chama de “interessantes” as considerações a Ricardo, faz uma discussão de bondade, refuta das fontes confusas de Ricardo e afirma que os Brasileiros não são piores ou melhores que qualquer outro povo. Rui Ribeiro Couto (El Hombre Cordiale, 1931) é a referência de Holanda do conceito de cordialismo, que segundo Couto é a contribuição latino-americana ao mundo da aventura Celtibérica. Corpo e Alma do Brasil, de 1935, é publicada na integra e a obra finaliza com uma detalhada cronologia de Holanda por Maria Amélia Buarque de Holanda ( produzida em 1979) e das muitas informações destacam-se a infância de Holanda na rua Higienópolis, suas andanças aos cinemas no centro de São Paulo, a amizade com Oswald e Mário de Andrade, sua vida movimentada nos bares e seu retorno ao Brasil da Alemanha em 1930.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

FILME DRÁCULA DE BRAM STOKER

- Eu não sou um lunático. Sou um homem são lutando por sua alma.

Muitos filmes já foram feitos sobre o personagem, que hoje está em desgraça por causa da saga Crepúsculo que ainda tem filmes chegando ao cinema. De muito tempo para cá, o personagem original, baseado no livro escrito por Bram Stoker, foi caindo cada vez mais em desuso.
Stoker baseou a história em um personagem real: Conde Vlad, também conhecido como empalador. Era um general do exército que empalava os seus inimigos em uma lança e os deixava escorregar lentamente de uma ponta à outra. Fato que aparece em uma cena maravilhosa logo nos primeiros momentos do filme. Quando também descobrimos que sua amada morreu e ele renuncia a igreja se transformando em um vampiro. Sua idéia é abraçar a imortalidade e esperar a reencarnação de sua amada.
Até que o momento chega, e a reencarnação é a noiva de Jonathan Hacker (Keanu Reeves), Mina (Wynona Ryder). Hacker é enviado para Transilvânia para cuidar da aquisição de algumas propriedades que Drácula (Gary Oldman) está fazendo em Londres. Hacker acaba prisioneiro enquanto Dracula vai tentar conquistar (ou reconquistar?) sua amada. Para se alimentar e permanecer jovem, ele ataca Lucy, a melhor amiga de Mina. O médico dela chama um professor Van Helsing (Anthony Hopkins) para ajudar no caso, formando um grupo disposto a perseguir e matar Dracula.
Coppola é um mestre na direção, mas não consegue acertar inteiramente a mão. Ele é capaz de construir cenas maravilhosas. E muitas cenas maravilhosas. Além disso, o filme se vale de trucagens de câmera ao invés de efeitos digitalizados. Cinema ao modo antigo no melhor estilo Coppola. O visual todo também é perfeito para o tipo de filme, mas ainda assim ele falha ao criar o filme definitivo sobre Drácula.
Isso porque ele está mais preocupado em criar um espetáculo visual do que contar uma história. Copolla se perde em inúmeros subplots e narrações totalmente desnecessárias para a história principal. O desenvolvimento perde a coerência e fica cada mais mais difícil de acompanhar o que está acontecendo. O que é o único, porém um grande, problema do filme.
Até porque o elenco está quase todo impecável. O único que destoa um pouquinho é Reeves, que não acompanha a veracidade e ferocidade que Hopkins, Ryder e Oldman dão aos seus personagens. Mas nada que chegue a atrapalhar alguma coisa.
Tivesse trabalhado mais na história do filme, Coppola poderia ter levado mais um Oscar para casa. Acabou se perdendo cada vez mais depois desse filme.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

LIVRO TWISS, Miranda. Os mais perversos da história

TWISS, Miranda. Os mais perversos da história. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2005.

O mal, independente das implicações e até mesmo das subjetividades da palavra, de acordo com o contexto cultural e outras questões, é algo que curiosamente desperta interesse em muitas pessoas. Os motivos podem ser dos mais diversos; desde o simples aprendizado ao entretenimento ou até mesmo admiração, a maldade dos indivíduos chama a atenção e causa tanto espanto quanto curiosidade. E é justamente essa curiosidade – ou qualquer outro motivo citado ou não citado – que é aguçada pela leitura da presente obra, Os mais perversos da história.
Miranda Twiss, que é formada em história e inglês pelo Goldsmith’s College, da Universidade de Londres, reservou nesse livro espaço para os homens e mulheres que julgou os mais perversos da história. Percebe-se logo de início, ao ler o índice, que a maioria das pessoas citadas foram governantes ou possuíam prestígio político, e não necessariamente cometeram diversos assassinatos pessoalmente. Contudo, foram responsáveis, sejam por ordens diretas ou por suas políticas, pela morte de muitas pessoas. Em alguns casos, nem mesmo um número aproximado de mortes é possível.
Os personagens são apresentados de forma cronológica, começando por dois imperadores romanos: Calígula e Nero. Explorando a megalomania e as extravagâncias de ambos, Miranda Twiss apresenta alguns dos acontecimentos mais bizarros relacionados a essas figuras. O mesmo se repetirá no decorrer do livro.
Em seguida, a autora passa por Átila, o Huno, ressaltando o medo que o “flagelo de Deus” impunha aos seus inimigos, e passando para o Rei João, da Inglaterra. Adiante, Twiss fala sobre Tomás de Torquemada, o inquisidor mais implacável da história da Inquisição Espanhola, e passa a tratar posteriormente sobre Vlad Tepes, o empalador, príncipe da Valáquia, na atual Romênia e inspirador de Drácula, um dos mais famosos personagens da literatura em todos os tempos.
Indo para a conquista das Américas, a autora fala sobre Francisco Pizarro, conquistador dos Incas, relatando sua luta contra Atahualpa, um dos dois governantes do então dividido império e algumas das atrocidades dos espanhóis no continente. Em seguida, três governantes são tratados: Maria Tudor e a eliminação de centenas de protestantes, Ivã IV, também conhecido como Ivã, o Terrível e Elizabeth, condessa de Bathory, que entre outros epítetos, é também chamada de “condessa sanguinária”, possivelmente responsável, segundo muitos relatos, por mais de seiscentas mortes, pessoalmente ou com ajuda de seus capangas.
A seguir, dois capítulos dedicados à Rússia/União Soviética: Raspútin e Joseph Stalin. O primeiro, um monge cercado de mistério que influenciara o czar e sua esposa ao ponto de manipular o governo russo; o segundo, o oportunista ditador soviético responsável talvez pelo maior número de mortes já creditadas a um governante, ao menos recentemente.
Em seguida, é apresentado o mais conhecido de todos: Adolf Hitler. Sem fugir do período da Segunda Guerra Mundial, temos Ilse Koch, a “cadela de Buschenwald”, responsável pela tortura e morte de um grande número de prisioneiros neste campo de concentração, onde ordenava a retirada de suas peles para a confecção de abajures e outro itens. Por fim, Miranda trata sobre Pol Pot, um dos maiores genocidas do século XX e a desgraça social, econômica e cultural que este trouxe ao Camboja, e Idi Amin, o megalomaníaco ditador ugandense.
Para cada um dos indivíduos, Miranda Twiss trabalhou com uma média de três a cinco livros. Nenhuma fonte primária foi utilizada; Twiss limitou-se a fazer uma revisão bibliográfica de cada um dos personagens trabalhados. Fica claro que em cada um dos casos, o que a autora se propôs a fazer foi um artigo, baseado em alguns livros, fazendo uma história descritiva de cada um. Não há nenhuma grande problematização nos capítulos, mas felizmente a autora se preocupa em apontar que alguns relatos e conhecimentos acerca do indivíduo se misturam com lendas e relatos fantasiosos sobre seus feitos. Por fim, vale citar que alguns dos méritos destes personagens como governantes foram ressaltados, o que em nenhum momento toma destaque ou serve de justificativa para suas atitudes.
É um livro de leitura muito simples, rápida e instigante. Academicamente, poderia não despertar tanta credibilidade, mas para entusiastas de história, é uma leitura agradável, ideal para despertar interesse em assuntos relativos aos indivíduos tratados (como suas políticas, as teorias que guiaram seus ideais, etc). Sua leitura, por si só, não deve ser considerada suficiente. Os livros indicados na bibliografia para cada caso, embora todos em inglês, são mais recomendados a quem se interessar e tiver condições de lê-los;

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

FILME LEONE, Sergio TRÊS HOMENS EM CONFLITO

- Duzentos mil dólares é muito dinheiro. Vamos ter que fazer por merecer.

Na minha humilde opinião, esse se trata de um dos melhores faroestes de todos os tempos. E feito por ninguém menos que um gênio: Sergio Leone. O maior nome dos chamados "faroestes spaghetti". E esse é provavelmente o maior, e melhor, dos filmes spaghetti. Somente Leone competiria com ele mesmo lançando Era uma vez no oeste.
Antes de começar a falar do filme, é melhor avisar que este é a terceira parte de uma trilogia: A trilogia do homem sem nome. É chamada assim, porque o personagem principal interpretado por Clint Eastwood nunca se apresenta. No primeiro filme o chamam de Joe, no segundo Manco e aqui um personagem o chama de Blondie.
Talvez assim que deva ser um personagem de faroeste: um homem sem nome e sem passado. E digo isso, porque não precisa assistir os dois filmes anteriores para curtir esse. Ele fala pouco, mas sempre evoca autoridade. Não é o tipo de cara que você se meteria.
O filme foca em três personagens: Blondie é o bom, Olhos de Anjo (Lee Van Cleef) é o mau e Tuco (Eli Wallach) é o feio (do nome original, The good, the bad and the ugly). A história dos três se junta porque estão atrás de duzentos mil dólares em ouro, o que era muito dinheiro naquela época. Segundo uma conversão que li, esse dinheiro hoje seria equivalente a mais de 10 milhões. Por isso que eles fazem por merecer esse dinheiro.
Os dois filmes anteriores parecem apenas um rascunho do que Leone estava a ponto de nos presentear. Eram extremamente baratos, o que atrapalhava o resultado final. Aqui ele não tem essa limitação, o filme contava com um orçamento de 1.6 milhões de dólares. Considere ainda que todo o elenco era muito barato (na época, Eastwood ainda era ator de TV e visto como nada rentável - quem pagaria pra ver um ator que pode ver de graça na TV?), que podemos considerar que todo o dinheiro era usado para fazer o filme. Isso inclui a explosão real de uma ponte (que por um erro teve que ser reconstruída para explodirem de novo).
Leone usa um recurso muito interessante pouco usado em faroeste, especialmente os de Ford, os close-ups. As cenas fechadas limitam o espaço conhecido pelo espectador. O que não vemos, pode nos surpreender. Há uma cena, por exemplo, que Tuco e Blondie caminham em uma estrada e são surpreendidos por soldados que os capturam. Eles dão apenas dois passos e se encontram num acampamento gigantesco, com milhares de pessoas. Como eles não puderam ver aquilo? Pelo mesmo motivo que nós: não estava aparecendo no quadro. Simples assim. Outras cenas ilustram o mesmo conceito.
E tudo termina num "trielo" maravilhoso. O conceito por si só já é interessante. Três homens armados se distanciam. Quem atira em quem? Se um atirar um no outro, o terceiro escapa. E por aí vai com outras possibilidades. Para melhorar, Leone testa os limites da paciência da platéia. O tempo se estende a um ponto tal que parece que o tiroteio nunca vai acontecer realmente. E quando parece que vão atirar, ele alonga o tempo mais um pouco. É de roer as unhas.
Com certeza é uma obra prima maravilhosa.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

LIVRO BURKE, Peter. Hibridismo cultural

BURKE, Peter. Hibridismo cultural. São Leopoldo; Editora Unisinos, 2008.

Em um mundo onde os termos “globalização” ou “mundialização” nos batem à porta com elevada frequência, questões acerca de encontros culturais, nos mais diversos cantos do globo, são mais do que pertinentes. Neste caso, poucos seriam mais gabaritados a tratarem do assunto do que Peter Burke. Em Hibridismo cultural, Burke trata das questões acerca das trocas culturais, as quais vemos todos os dias mas muitas vezes sequer percebemos.
Na obra em questão, Burke não tenta glorificar o hibridismo cultural, que a intitula, tampouco tenta ser seu detrator. Reservando-se apenas à função de analisar o tema, Burke faz uso de uma miríade de autores, de historiadores a antropólogos, que trabalharam com o tema em outras oportunidades, condensando muitas de suas argumentações. Novamente a admiração de Burke por Gilberto Freyre é escancarada, sendo o brasileiro um dos autores com os quais Burke dialoga em Hibridismo cultural.
Em sua análise a respeito dos intercâmbios culturais, Burke separa muito bem os pontos a serem tratados individualmente. Após uma elucidativa introdução, o autor prossegue a discussão analisando a priori os objetos. A língua, a música, a iconografia... A miríade de objetos sob os quais um olhar pode ser lançado com o objetivo de se analisar as trocas culturais é vasta, assim como as terminologias a serem usadas por quem os analisa. As variedades de reações causadas por esses contato cultural e algumas das situações que mais permitem as trocas são, também, discutidas pelo autor. Assim como outro autores no passado – como Mikhail Bakhtin e Carlo Ginzburg –, Burke trabalha com a idéia de circularidade cultural. Assim como uma cultura pode ser passada de uma população para outra (apenas um exemplo), um objeto (por exemplo, a iconografia presente nas peças de porcelana, tal qual Burke cita no livro) pode ser associada, modificada pelas particularidades locais, sejam elas semelhantes às particularidades originais ou não, e acabar voltando ao ponto de origem, influenciando a cultura da qual saiu por conta de seus novos atributos, inseridos pela cultura que a recebeu.
Trata-se de um livro pequeno, que pode ser facilmente lido em uma única tarde. Como sempre, os textos de Burke fluem facilmente e todas as argumentações são apresentadas com extrema clareza. É uma excelente obra para qualquer historiador, antropólogo ou sociólogo interessado no assunto, e pode servir de ponto de partida; sua leitura facilita a compreensão dos autores citados no texto, com os supracitados Ginzburg e Bakhtin. Altamente recomendado.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

FILME PETERSEN, Wolfgang TRÓIA

TRÓIA
Direção: Wolfgang Petersen
Elenco: Eric Bana, Orlando Bloom, Brad Pitt, Diane Kruger, Rose Byrne, Peter O`Toole, Sean Bean, Brian Cox.
Direção: Wolfgang Petersen
Antes de criticar o filme convém explicitar o enredo do mesmo.
A película é sobre a guerra que povoa o imaginário de todos, inclusive aqueles que nada sabem sobre ela. Pois basta falar gregos, troianos, presente de grego, e outros detalhes que segue o famoso "Ah! A coisa do cavalo..."
Bem, desde já deixo dito que há a versão do filme da estória, a versão homérica da Ilíada e a lenda que chega por tradição oral.
O filmado mostra, inicialmente, como Agamenon consolidou seu poder entre os gregos, valendo-se das habilidades guerreiras de Aquiles. Desde este momento, começo da trama, já fica explícita a desavença e o atrito entre os personagens citados.
A trama segue a crescente com a mostra da embaixada da cidade de Tróia em solo espartano. Neste ponto os contornos são delimitados, Paris apaixona-se por Helena, rainha de Esparta, e esta foge com o primeiro. O ultraje feito ao rei de Esparta, irmão de Agamenon, é usado pelo último como via de realização de seus sonhos de grandeza (o tom pejorativo é proposital por o filme o alçar ao grau de vilão). Assim, dá-se início a marcha para a guerra. Agora é Gregos vs Troianos.
Todavia os helenos (gregos) necessitam de um trunfo. E o ás na manga é o "máquina zero" Aquiles, Príncipe guerreiro com movimentos que muito lembram Kung Fu (intercâmbio de civilizações? Não, nuance hollywoodiano mesmo.), fiel ao ideal que depois na História será materializado pelos ensinamentos de Aristóteles (na linha do tempo a Guerra de Tróia ocorreu muito antes do nascimento do filósofo mencionado). Na sequência ocorre o recrutamento de Aquiles (e seu primo Pátroclo) por Ulisses.
Guerra!
Os navios partem para a Ásia Menor, desembarque na praia, somente a falta de armas de fogo e artilharia deixam a cena devedora do desembarque na Normandia, o Dia D - A Operação Overlord (que pode ser experimentada no choque visual em filmes como "O Resgate do Soldado Ryan").
O combate flui, os gregos avançam, mas um ponto da trama se faz presente, o choque entre Agamenon e Aquiles. Tudo ocorre pela divisão dos espólios da batalha, em especial uma Serva de Apolo, Briseida, feita prisioneira (e futuramente recebendo o rótulo de escrava). Pelo desentendimento Aquiles se retira dos embates, os troianos tem folga e passam a aproveitar os benefícios das vitórias.
A ironia se faz presente... o primo usando a armadura de Aquiles desafia o campeão inimigo, Heitor. Este vence.
Aqui há a conhecidência com a versão de Homero. O poema trata da ira de Aquiles e como em sua arrogância narcisista ele fica injuriado e dirige sua fúria contra Heitor (Fúria que se soma ao ultraje recebido de Agamenon). O poeta grego (ou poetas, para aqueles familiarizados com a polêmica que cerca a figura de Homero) mostra como o herói grego exalta a si mesmo pelos atos, pelas proezas bélicas, e a glória que lhe é roubada é uma ofensa que ele (Aquiles, filho de um rei humano com uma deusa) não pode tolerar. Assim, a balança dos combates volta a pender para o lado grego... Heitor cai morto. Porém as muralhas de Tróia são intransponíveis.
Um ponto que chama a atenção é o amor que Príamo, rei de Tróia, pai de Heitor, demonstra no diálogo secreto com Aquiles. Que não há amor como o de um pai para um filho, mesmo que o modo de externar tenha que ser póstumo. O beijo na mão do assassino.
Da trégua feita por Príamo e Aquiles para velar Heitor, Ulisses tem a idéia que levará os gregos à vitória final... o ardil (o cavalo gigante oco).
Com a utilização do cavalo, os gregos invadem Tróia e o combate dentro das muralhas leva apenas para um resultado, a cidade cai.
Agamenon morre por sua ganância, o defeito narrado leva a descuidos.
Aquiles morre aos pés de um templo do Deus que ofendeu no seu desembarque, Apolo. Porém sua morte não é gerada por suas falhas de caráter (vaidade, arrogância), mas sim morre de forma honrada, tentando salvar aquela que passou a amar, Briseida. Tróia está em ruínas, mas cidadãos conseguem fugir e a passagem simbólica da espada troiana, mostra a continuidade da cultura. Homero não narra esta parte, e a tradição lendária expõe que Aquiles nunca entrou na cidade, pois foi profetizado e realizado pelos deuses olímpicos, foi seu filho Neoptólemo (sim do Aquiles, com uma princesa, enquanto escondido numa corte alienígena, forma encontrada pela mãe-deusa para tentar evitar a participação na luta e, consequente, morte) quem concluiu os trabalhos.
A estória mostra como a civilização grega muda o ideal perseguido: do ideal físico (Aquiles) para o raciocínio (Ulisses). Tal visão é objeto da tradição oral que envolve a Guerra de Tróia.
Para concluir, o filme traz elementos fundamentais da tradição que envolve o mito de Tróia. Mostra as características das personalidades dos personagens, ressalta os benefícios e as desvantagens de cada uma. Ao adequar a estória aos moldes exigidos pela indústria cinematográfica, pontos marcantes são deixados de lado, a questão dos costumes da época (o primo na verdade não é primo, é outra coisa), bem como a influência dos deuses no cotidiano. Outros pontos são acrescentados, que não figuram em Homero e na tradição, em especial a visão maniqueísta (a clara distinção entre bem e mal, personagens heróicos e vilões). O filme, todavia, ao ser classificado deve ser enfocado como o que é: entretenimento. E para isto é bem sucedido, ele é longo, mas não dá para perceber o lapso de tempo gasto, assim, polegares para cima.

LIVRO BURKE, Peter. Testemunha ocular

BURKE, Peter. Testemunha ocular: história e imagem. Bauru: EDUSC, 2004.

Houve um livro cuja leitura me inspirou a criar este blog. O livro é este que passo a resenhar: Testemunha ocular, de Peter Burke.
Burke, como alguns já sabem, mas tantos outro não, é um inglês professor de História Cultura na Universidade de Cambridge e, segundo fui informado, é colunista de um grande jornal de São Paulo no caderno “Mais” de domingo. Casado com uma professora brasileira, Maria Lúcia Pallares-Burke, é um conhecedor de nossa cultura e grande admirador de Gilberto Freyre.
Neste livro, Burke tenta mostrar ao historiador a importância das imagens como fontes históricas. Entretanto, é necessário informar desde o início que o livro, ao contrário do que possa parecer, não é uma espécie de guia com fórmulas para análise de imagens como fontes. Uma de suas principais funções, na realidade, é informar principalmente as armadilhas que as imagens podem oferecer a quem analisa.
Com um prefácio escrito pelo próprio Burke para a edição brasileira, o livro faz uma introdução ao tema, sendo que desta ressalto o trecho em que Burke afirma preferir o termo “indícios” ao invés de “fontes”, pois segundo ele:
“os historiadores têm se referido ao seus documentos como “fontes”, como se eles estivessem enchendo baldes no riacho da Verdade, suas histórias tornando-se cada vez mais puras, à medida que se aproximam das origens. A metáfora é vívida, mas também ilusória no sentido de que implica a possibilidade de um relato do passado que não seja contaminado por intermediários.”
O primeiro capítulo fala sobre a fotografia e a pintura com realismo fotográfico. Principalmente se atendo à primeira, o autor comenta sobre a facilidade com que alguém pode ser enganado pela impressão de realidade que uma foto dá. Afinal, por mais que a imagem esteja fielmente retratada, o que se vê é apenas uma parte do todo, a visão do fotógrafo, e este pode forjar uma cena. Já o segundo trata da iconografia e da iconologia, ambos os termos ás vezes colocados como sinônimos, significando o estudo da mensagem que a imagem tenta passar.
O terceiro capítulo trata do uso de imagens em religiões, geralmente como um instrumento de fé. Entre as discussões do mesmo, estão a figura do diabo, dos santos, a iconoclastia e a propagação de idéias por parte destas, como as imagens que criticavam a Igreja Católica Apostólica Romana, propagadas pelos protestantes. O quarto capítulo, abordando aspectos mais políticos, fala do uso da imagem como arma de protesto e o seu poder para tal fim. Já o quinto mostra a imagem como veículo de propagação da cultura material, bem como ferramenta para sua compreensão, mostrando algumas das principais armadilhas desse tipo de divulgação e alguns casos conhecidos em que a imagem mostrava mais do que a realidade. Claro que não podemos desconsiderar casos em que só através das imagens tivemos acesso visual a coisas que já não mais existem.
O aspecto social é mais discutido em capítulos posteriores. O sexto, intitulado “Visões de sociedade”, aborda a retratação de determinados aspectos sociais e de seus elementos. Uma parte do capítulo, por exemplo, é dedicada apenas à retratação das crianças, enquanto outra é dedicada às mulheres. O sétimo, o primeiro capítulo com o qual tive contato e, na minha opinião, um dos melhores, fala do perigo do estereótipo. A imagem do outro, o desconhecido, formada em cima de clichês ou de pré-concepções é algo pertinente demais na sociedade, e por que não dizer que é algo incrustado no ser humano... de qualquer modo, o capítulo ressalta que nem todo o estereótipo é leviano, sendo por vezes a primeira imagem que se tem de algo que não se conhece, á partir de elementos comuns ao espectador.
O capítulo seguinte é dedicado á idéia de “Narrativas Visuais”, partindo do pressuposto que toda a imagem conta uma história, desde uma imagem única até uma série de imagens. O nono aborda o pintor ou o cineasta como propagadores da história, á partir do momento que deixam de ser testemunha e passam a ser “historiadores”. Novamente Burke atesta para as diversas armadilhas da imagem.
O fim do livro, mais precisamente os capítulos 10 e 11, abordam os aspectos psicológicos e culturais das mesmas. Ao fim do último capítulo, Burke novamente ressalta o objetivo de seu livro. Algumas frases-chave para o entendimento da obra são:
“As imagens dão acesso não ao mundo social diretamente, mas sim, visões contemporâneas daquele mundo [...] O testemunho das imagens necessita ser colocado no “contexto”, ou melhor, em uma série de contextos no plural (cultural, político, material, e assim por diante [...] Uma série de imagens oferece testemunho mais confiável do que imagens individuais [...] No caso de imagens, como no caso de textos, o historiador necessita ler nas entrelinhas, observando os detalhes pequenos mas significativos – incluindo ausências significativas – usando-os como pistas para informações que os produtores de imagens não sabiam que eles sabiam, ou para suposições que eles não estavam conscientes de possuir.”
Possivelmente, a pergunta que fica no ar é: por que este livro é indispensável?
Foi-se o tempo em que a história era apenas uma pesquisa de documentos oficiais, focada em uma história intrinsecamente positivista, aonde os documentos falavam por si e demais fontes eram ignoradas. Hoje existe a consciência de que imagens podem nos fornecer valiosos testemunhos que a escrita ou a oralidade não o podem, na maior parte das vezes por um distanciamento da época retratada. Você ultrapassa as barreiras das histórias oficiais e passa a ver, mesmo que como um leve resquício, coisas que estes documentos não podem mostrar, como imagens do cotidiano de pessoas menos favorecidas economicamente e iletradas; ou seja, que não podiam perpetuar seu testemunho.
Sobre o livro, fisicamente falando, é necessário ressaltar que se trata de um exemplar de ótima qualidade. Ricamente ilustrado (o que não poderia deixar de ser) e feito com papel reciclado, é visualmente muito bonito.
Como já ressaltei, este livro não ensina fórmulas de análise. Contudo, fornece informações valiosas sobre os perigos desta mesma análise, tanto quanto ressalta sua importância. Claro que, se você é apenas um entusiasta da história, pode não se interessar pelas entrelinhas de uma imagem, mas fica aqui a dica de uma obra excelente.

domingo, 2 de outubro de 2011

FILME Entrevista com o Vampiro

- Seu sangue amaldiçoou minhas veias mais doce que a própria vida. Foi então que as palavras de Lestat fizeram sentido para mim. Eu só conhecia a paz quando matava.

Antes de vampiros virarem material de bobagens como Crepúsculo e Os diários do vampiro, eles eram usados como personagens de terror. Anne Rice, escreveu uma série de livros e escreveu o roteiro adaptando um deles para o cinema. O resultado se encontra aqui, em mais um belo filme de Neil Jordan (não creditado como roterista).
Acompanhamos Louis (Brad Pitt) contando sua longa vida de vampriro para um repórter (Christian Slater). Não toda sua vida, mas a partir do momento em que foi transformado. Começa em 1700, logo após a morte de sua mulher e filha (no livro ele nunca teve uma esposa). Louis se encontra em tamanho desespero que faz qualquer besteira que possa o levar à morte. Ao invés disso, ele encontra o vampiro Lestat (Tom Cruise).
Lestat lhe faz uma proposta simples: ou Louis aceita se transformar em um vampiro e lhe fazer companhia ou Lestat dará a morte que ele tanto deseja. Claro que Louis se transforma em um vampiro e os dois ficam passeando (e se alimentando) pelas principais cidades da época.
Há uma coisa aqui que o diferencia dos demais filmes. Não há uma "glamourização" no fato de ser vampiro. O personagem Louis é melancólico. Ele sempre se arrepende de ter se transformado no que se transformou. Duas pessoas no filme vão lhe pedir para virarem vampiros, e ele não tem a menor intenção de transformar nenhuma delas.
Ao mesmo tempo, o filme desmistifica muito coisa sobre os vampiros. Os vampiros aqui não morrem com estacas no coração, não temem símbolos religiosos ou coisa do gênero. Fica um ar de realidade no ar. Algo do tipo: "como seria se um vampiro realmente existisse". O que o torna muito interessante.
O filme não se aproxima muito do terror também. Cada mordida é feita com finesse. Há uma sedução no ar, mesmo quando Lestat vai morder Louis, há uma sedução. Não acho que chegue a ser homossexual, na verdade os vampiros não parecem ter apenas uma preferência sexual. Eles não estão apenas dizimando gado, eles estão realizando uma caça. Talvez o mais divertido seja a caça.
Inclusive, por isso acontece a parte mais assustadora do filme: eles transformam uma criança de 12 anos em uma vampira. Ela tem um rosto angelical e uma veia assassina que se transformam numa mistura impressionante. Vale ressaltar que ela não é uma má pessoa, ela na maioria das vezes sequer tem noção do que faz a princípio. É apenas uma criança que mata, e com passar dos anos sua aparência não muda. Nem nunca mudará.
Tom Cruise foi criticado pela sua escolha, mas está ótimo no papel. Há algo em sua maquiagem que tira a aura de astro misturado com uma atuação contida. O melhor do filme, sem dúvida.
A única coisa que me incomoda é que pouca coisa acontece no filme. É como uma vida normal de uma pessoa, só que bem mais longa. Sinto falta de alguma grande ação que levasse para o final, ao invés de ficar quase que numa enrolação. Não queria esperar tanto assim para o final do filme. Afinal,não sou imortal como eles.

OBS: O papel do repórter deveria ser interpretado por River Phoenix (irmão de Joaquin Phoenix), mas ele morreu de overdose antes do início das filmagens. Por isso o filme é dedicado a ele.

LIVRO BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929-1989)

BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929-1989): a Revolução Francesa da Historiografia. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1997.

Sem dúvida, a originalidade e a inovação são caminhos que levam qualquer profissional, de qualquer área, a tornar-se referência. Eis que na historiografia essa regra não é inexistente. O inglês Peter Burke reitera isto ao publicar esta obra, A escola dos Annales.
Annales foi uma revista criada na França em 1929, responsável pela criação do que hoje é chamado de “Nova História”. Até o momento da criação desta revista, a história era basicamente positivista. Esta história consiste na exaltação de grandes homens, grandes feitos, uma história política que em muitos casos era uma forma de legitimação. Quaisquer outras abordagens históricas, quando tentadas, dificilmente recebiam o devido interesse. Aos poucos, essa história positivista fortemente influenciada pelas Ciências Naturais começou a receber duras críticas, principalmente por parte dos durkheimianos. Foi então que Lucien Febvre e Mark Bloch criaram a já citada revista Annales. Sua metodologia, que futuramente se estabeleceu como novo paradigma, consistia em abrir caminho para uma interdisciplinaridade entre a história e as Ciências Sociais, aos poucos estendendo esta conexão com outras disciplinas como a Geografia, Antropologia e a Psicologia.
A história que até o momento consistia apenas em apresentar a narrativa de acordo com as fontes – e nesse caso as fontes dificilmente ultrapassavam os limites da escrita – passou a apresentar mais do que narrativas, mas problemáticas; deixando de focar exclusivamente em grandes feitos, abrindo caminho para o estudo de temas cotidianos. Essa roupagem que lembrava as ciências sociais deu à história uma concepção mais científica que até o momento relutava-se em admitir.
Sendo um pouco mais específico, pode-se dizer que a história tradicional era narrativa, possuía uma cronologia definida, escrita de forma linear, usando documentos oficiais como fonte, era evolucionista e privilegiava fatos de cunho político. A história-problema foge deste padrão, a começar pelas fontes. Tal qual Gilberto Freyre fez em seu clássico Casa grande e senzala, o novo historiador utiliza-se de fontes diversas, de imagem à arquitetura. Dispensa uma ordem cronológica e, mais do que reproduzir os documentos, ele precisa interpretá-los; escolhe um objeto de estudo presente e busca as respostas no passado. Não tenta ser imparcial, anulando sua crítica e sua opinião, e claramente escolhe os fatos de acordo com o que for mais conveniente para seu estudo. Mais do que narração de fatos, essa Nova História está carregada de senso crítico.
A primeira geração da escola dos Annales foi liderada basicamente pelos seus criadores: Lucien Febvre – o maior defensor da história-problema, do uso de fontes não-documentais e do diálogo entre os historiadores quanto a suas metodologias – e Mark Bloch. Estes, entre outras coisas, buscavam mais do que as singularidades da história, marca positivista; buscavam uma “história das mentalidades”. Algo diferente do que o líder da segunda geração da escola, Fernand Braudel, focalizou.
Braudel acreditava em uma história de “três períodos”. A história de curta duração, média duração e longa duração. A primeira podemos explicar fazendo uma analogia com as noticias que diariamente vemos nos jornais. Fatos que fazem parte de uma história de um curto período. Um período maior classifica-se como média duração e por fim, a história de longa duração é aquela que para Braudel importava. A história de longa duração não sofria interferência de pequenos fatos, da história de curta duração.
Criando sua metodologia em cima de uma história que, mantendo-se interdisciplinar, era claramente quantitativa, Braudel usou a demografia e o tempo como objetos de estudo. Sua obra mais importante, O Mediterrâneo e Felipe II, é um claro exemplo disto. A obra apresenta de forma clara que, para o autor, a geografia e o tempo são de importante influência na história. Não podemos ignorar, obviamente, o fato desta obra ter sido criticada consideravelmente, mas seria um erro ainda maior ignorar os paradigmas que ela ajudou a fortalecer. Neste ponto a história das mentalidades sofreu um decréscimo de importância, visto que nesta nova abordagem quantitativa a história das mentalidades não possuía a mesma sustentação que a história socioeconômica.
Durante a terceira geração da escola dos Annales, duras críticas foram advindas de sua abordagem. Por conta de sua crítica, os historiadores do movimento foram acusados de negligenciarem a história política. A crítica não procedia, pois o afastamento da história política não era algo generalizado dentro dos Annales. Nesta época há uma retomada da história narrativa e de eventos.
O livro de Peter Burke não é o único que aborda a escola dos Annales. Contudo, pode ser considerada a mais bem-sucedida síntese do que foi este movimento e o que ele significou para a história. Desmistifica a idéia de conflito entre a História Cultural e a História Marxista, nos apresenta com riqueza de informações a evolução do movimento, seus grandes nomes e suas metodologias. Historiadores em geral devem ter contato com esta obra, já que dela podem ser extraídas informações cruciais para o entendimento das mudanças que marcaram a escrita da história no século XX. Se hoje a história é tão vastamente fragmentada – e não dou a esta fragmentação um caráter pejorativo, visto que o leque de possibilidades aumenta consideravelmente –, devemos isto em grande parte ao movimento que este livro tão competentemente analisa.

sábado, 1 de outubro de 2011

LIVRO SANTO AGOSTINHO. O Livre Arbítrio

SANTO AGOSTINHO. O livre-arbítrio. Tradução, introdução e notas de Nair de Assis Oliveira. Ver. de Honório Dalbosco. São Paulo: Paulus, 1995.

Quando lemos Santo Agostinho com a alma, e mergulharmos na meditação de seu pensamento, torna-se irresistível o desejo do conhecimento, da busca do essencial. É como se o universo se abrisse dentro de nós, e pudessemos com ele navegar nas profundezas do conhecimento humano.
Engana-se quem pensa que a leitura de Santo Agostinho seja algo ultrapassado. Ele é tão atual e majestoso como o foi á 16 séculos atrás. Santo Agostinho é fé, é razão, é questionamento, inquietação e desejo de saber.
Durante a leitura, parece que nos sentimos transportados para uma região obscura e secreta da alma, para um labirinto de idéias e imagens inconcebíveis ao homem superficial. É um mundo novo. E exatamente ai, no limite da fronteiriço entre a fé e a razão, que maravilhosamente vemos as águas se juntarem formando um só rio. Fica aquele sentimento do marinheiro que depois de longa viagem, descobre um novo continente.
O Livre Arbítrio é um convite ao conhecimento. Ao conhecimento interior, é filosofia na sua essência. Deus é mal? Deus é o autor do mal? porque existe sofrimento se Deus é bom? Esses e outros questionamentos são analisados à exaustão. Mas o leitor menos preparado não deve temer, pois vai bem acompanhado. Santo Agostinho não nos deixa sozinhos e como que abandonados a nossa própria sorte, perdidos numa floresta de pensamentos. Mas como astuto instrutor, vai nos respondendo na mesma medida em que nos questiona novamente , tudo isso num ciclo genial até o momento em que nós encontramos no centro de nós mesmos. E dai fica fácil descobrir porque toda vida é especial, e todo homem é único.
Santo Agostinho é um daqueles gênios com que a vida presenteia a humanidade de século em século. É um daqueles homens raros, por muitos incompreendido, por alguns subestimado, mas sempre respeitado.
Segundo Santo Agostinho, o homem é dotado de racionalidade e de uma vontade pessoal livre, que em si mesma já é um bem, para que cada ser humano em particular possa discernir que rumo seguir: para que se volte ao Bem supremo, Deus e, assim, possua-o na beatitude, isto é, na Vera Vita Beata; ou para d’Ele se afastar preferindo os bens inferiores da criação, em que consiste o mal moral ou o pecado, ou seja, a infelicidade humana. Com efeito, a vontade livre é mestra de si mesma e somente dela depende o mau uso do bem que ela é. E, tanto mais livre se torna quanto mais se conforma à ordem, submetendo-se a Deus.
Em suma, o livre-arbítrio é o sujeito moral, segundo a filosofia agostiniana. Essa dimensão da autonomia que permite ao homem responsabilizar-se por seus atos, simplesmente inexistia no Maniqueísmo, que definia o homem como um simples joguete de forças antagônicas que o constituíam; e Deus, como um dos princípios constitutivos da natureza humana, encerrado sob formas corpóreas, como pura materialidade, assim como as Trevas que se lhe opunham.
O mal, portanto, é um dos caminhos pelos quais a vontade livre pode se enveredar, porém, não no sentido de que existam coisas más a escolher – já que tudo o que existe é bom – nem tampouco de que seja da essencialidade do livre-arbítrio o pecar, pois Deus o deu para que o homem viva retamente. De fato, quem não é livre, não pode pecar, contudo, sem a possibilidade de pecar ou agir retamente, de infringir ou seguir a ordem divina, o homem não teria autonomia para buscar a Verdadeira Felicidade ou renegá-la nem poderia, consequentemente, conhecer a Justiça de Deus. Sobre a essencialidade do livre-arbítrio e a concepção de Justiça divina, conclui Santo Agostinho:
É verdade que o homem em si seja certo bem e que não poderia agir bem, a não ser querendo; seria preciso que gozasse de vontade livre, sem a qual não poderia proceder dessa maneira [...]. Há, pois, uma razão suficiente para ter sido dada, já que sem ela o homem não poderia viver retamente. Ora, que ela tenha sido dada para esse fim pode se compreender logo, pela única consideração de que, se alguém se servir dela para pecar, recairão sobre ele os castigos da parte de Deus. Ora, seria isso uma injustiça, se a vontade livre fosse dada, não somente para se viver retamente, mas igualmente para se pecar. Na verdade, como poderia ser castigado, com justiça, aquele que se servisse de sua vontade para o fim mesmo para o qual ela lhe fora dada? (AGOSTINHO, 1995, II, 1, 3)

FILME MATRIX

- Eu sei porque você está aqui, Neo. Eu sei o que tem feito. Você está procurando por ele. Eu sei porque eu estava procurando pela mesma coisa. E quando o encontrei ele disse que eu não estava procurando por ele, estava procurando por uma resposta. É a questão que nos motiva, Neo. É a questão que te trouxe aqui. Você sabe a pergunta, Neo, assim como eu sabia.
- O que é Matrix?


Em 1999, chegaram aos cinemas dois filmes que prometiam revolucionar o cinema: George Lucas iniciava uma nova trilogia da franquia de maior sucesso da história com Guerra nas estrelas - A ameaça fantasma. Já cultuada por milhões de fãs espalhados pelo mundo, o restart da franquia deixou muita gente decepcionada. Correndo por fora veio também esta fábula de ficção científica, que viria a se transformar numa trilogia e arrebatou muitos fãs também. No quesito de revolucionar o cinema, porém, os dois falharam, mas Matrix pelo menos chegou um pouco mais perto.
Keanu Reeves interpreta um personagem duplo, de dia é um programador conhecido como Thomas Anderson, e de noite é um hacker conhecido apenas por Neo. Neo é convencido por uma mulher, Trinity, (Carrie-Anne Moss) a se aventurar em descobrir o que é a Matrix do título. É assim que ele chega ao enigmático líder dos homens de couro conhecido como Morpheus (Laurence Fishburne).
E é assim que ele descobre a verdade. Uma verdade tão grande que mesmo quem nunca assistiu o filme conhece: o mundo em que vivemos não é real, é uma realidade virtual criada para não percebermos que somos escravos de máquinas que nos usam como fonte de energia. Morpheus acredita que existem pessoas com poder de controlar os elementos da Matrix, e que Neo é um deles. O escolhido.
A trama montada pelos irmãos Wachowski (na época do filme, Andy e Larry, que agora atende por Lana) é muito intrigante e segura a platéia. E não segura apenas pela trama, mas também pelo visual do filme que é arrebatador. Figurinos e fotografia estão ótimos. Aliado a isso estão cenas de ação espetaculares e lutas que desafiam a gravidade. Efeitos especiais revolucionários totalmente integrados ao filme (não se esqueçam que os efeitos bullet time foram um dos mais copiados do cinema). Tudo muito divertido, mas poderia ter ido além. Acabou ficando no meio do caminho.
O único problema, é que depois de tudo isso, eles apelam para fórmula. Os bandidos atiram nos mocinhos e erram. Os mocinhos conseguem escapar. Aí entra uma luta onde o bandido bate no mocinho até quase matá-lo. Então o mocinho descobre uma força interior que o permite derrotar o bandido. Tudo isso já tinha sido feito, todos já viram. Só não perdem muitos pontos, porque dificilmente foi visto com cenas tão brilhantes como estas.
No final fica parecendo uma espécie de video game muito bem feito. Tem até mesmo os vilões da fase: os agentes (o principal interpretado por Hugo Weaving). Eles são uma espécie de Irmãos cara de pau que servem para matar os mocinhos.
Podia ter revolucionado, mas não conseguiu por esse pequeno detalhe. Tivessem dado uma conclusão espetacular ao filme, sem ser apenas um tiroteio muito bem coreografado, o filme seria perfeito. Se tivesse ao menos um detalhe mais intrigante para segurar melhor a platéia depois do tiroteio, seria quase perfeito. Mas ao invés disso, deixaram o final em aberto para concluir ao final da trilogia. O resultado são dois filmes ruins que não acompanham satisfatoriamente este aqui e que fecham de maneira fraca uma trilogia que poderia ter sido muito mais. Dos três, só fico com esse.